Por que incluir “Projeto de Vida” no 9º ano?

Por Fernando Pimentel, Coordenador Pedagógico de 7º ao 9º ano do Ensino Fundamental. 

A reforma do Ensino Médio, que se concretizou na maioria das escolas em 2022, traz uma importante oportunidade para a educação em nosso país. Não podemos, no entanto, deixar de olhar criticamente para os riscos que tal flexibilidade, característica central na nova proposta, traz: as distâncias entre escolas públicas e privadas aumentarão? Com diferentes estruturas e recursos, os itinerários formativos oferecidos poderão aumentar a desigualdade social e de acesso à informação em nosso país? Essas preocupações precisam estar no olhar de todas as instituições educacionais.

Por outro lado, temos avanços importantes nesta nova proposta. Além de privilegiar o lugar da escolha dos estudantes na trajetória escolar, a obrigatoriedade da disciplina Projeto de Vida volta o olhar de educadoras e educadores do país para aspectos que extrapolam os conteúdos das disciplinas e permitem uma reflexão mais profunda sobre as ações, escolhas e impactos da ação individual e coletiva no mundo que temos e no mundo que queremos. 

Como Paulo Freire já nos disse, educar é um ato político. Fazer escolhas é um ato político. Retomando a história do patrono da educação brasileira, ao recusar o uso das cartilhas descontextualizadas e pensar uma educação que se relaciona ao contexto de vida dos educandos, Paulo Freire nos mostrou a importância de refletir sobre os impactos das escolhas que fazemos, cotidianamente, em nossas escolas. Para tanto, é preciso que educadores e estudantes se coloquem nestas reflexões. E aí está um importante valor que a disciplina Projeto de Vida carrega.

Enquanto espaço de abertura e reflexão, a nova disciplina carrega em sua proposta um suporte ao que o novo Ensino Médio propõe. Se oferecemos mais espaços de escolhas, precisamos ajudá-los a escolher. Ainda mais quando esta escolha se dá em contexto de extrema volatilidade como é a adolescência, sobretudo de uma aluna ou aluno que inicia o Ensino Médio. Em função disso, entendemos que o trabalho com a disciplina Projeto de Vida deve começar antes do Ensino Médio. 

“O tema central da adolescência é, portanto, a descoberta de si mesmo.” argumenta Antonio Carlos Amador Pereira em seu livro “Adolescência” (2005). Se nossos jovens estão a conhecer quem são, escolher se torna uma tarefa difícil. Mais difícil do que a escolha pulsional da infância; mais difícil do que a escolha embasada em experiências da vida adulta. Nesse terreno “pantanoso”, há fertilidade para que grandes descobertas aconteçam – sobre si, sobre os outros e sobre o mundo. 

Ajudá-los a se preparar para tais escolhas é, em alguma medida, ajudá-los a se conhecerem. Por isto, nos parece salutar aproveitar este espaço para ajudá-los a crescer, estimulá-los a se tornarem cada vez mais conscientes de seus desejos e medos, de seus talentos e desafios. Assim, a escola se caracteriza não como mera preparação para a vida, mas como parte central da vida do adolescente. Promover espaços de reflexão sobre as experiências recentes e futuras nos parece uma abordagem que beneficia, e muito, jovens que vivem em um mundo repleto de informações, mas que muitas vezes não sabem o que fazer com elas – o que gera angústia e ansiedade. Sobretudo após anos de isolamento social que marcaram profundamente esta geração. 

No Colégio Oswald de Andrade, ao longo desse trajeto, com o 9º ano, iniciamos com algumas perguntas provocativas: “Com quais matérias me identifico mais? Quais são mais desafiadoras? Com quais me identifico menos?”. Propusemos também aos estudantes que refletissem sobre suas escolhas em outros projetos (Projeto REDE, no Ensino Fundamental I; Projeto Oficinas Eletivas, no Ensino Fundamental II) – em nossa escola, as escolhas pessoais são um eixo que une diversos projetos, nos diferentes níveis -, buscando entender quais foram as escolhas bem sucedidas ou não. Também solicitamos aos estudantes o levantamento de temas que consideravam relevantes para ocupar este espaço. Com a concretização de um novo formato do Ensino Médio, foi oportuno trazer a coordenação do nível para apresentação desta nova organização. Por fim, concluímos o semestre com o apoio da equipe de Orientação Profissional, que promoveu uma dinâmica a fim de contribuir com a tomada de consciência dos estudantes sobre suas áreas de conhecimento de maior ou menor interesse.

Desta forma, pudemos trilhar uma caminhada dialógica entre estudantes e professores, visando o crescimento de todos os envolvidos. Do nosso ponto de vista, a educação precisa, constantemente, ser vivida desta forma.

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